Margaret Mead - Sexo e Temperamento: Os Arapesh da montanha

Sexo e Temperamento (Margaret Mead, de 1935) Editora Perspectiva, 4ª edição, 2000. Introdução e Capítulo sobre os Arapesh. 


Na introdução, pode-se constatar que o livro é um relato de como três sociedades primitivas agruparam suas atitudes sociais em relação ao temperamento no que tange às diferenças sexuais. O livro pretende comprovar supostas evidências empíricas da Influência da cultura na formação da personalidade e nos estereótipos de gênero. 
 
Contrapõem-se então à ideia de que o livro não é e não pretende ser um tratado de feminismo nem de direitos da mulher. Não quer discutir as diferenças dos sexos, sob o ponto de vista da instabilidade emocional, mas quer descobrir como nossa sociedade atribui papéis diferentes aos sexos. Toda sociedade constrói uma expectativa de comportamento desde o nascimento.

Buscando em Ruth Benedict seu embasamento, denota que culturas não pertencem a uma escala evolutiva. A crítica ao evolucionismo é evidente. Homens e mulheres são socialmente diferenciados e o sexo é forçado a conformar-se ao papel que lhe é atribuído. Alguns papéis sociais do sexo são expressos. (roupas, afazeres, modo de ser, cabelo grande/curto). Mas a pergunta feita por Mead é como nessas sociedades se constroem os papéis sociais do masculino e do feminino.

Temperamentos podem ser naturais a um sexo e podem ter variações no temperamento humano. Existem características gerais de cada gênero? A autora irá demonstrar que a cultura influencia o que uma sociedade pensa sobre o que significa ser homem ou mulher. Não há característica natural e universal de fêmea ou macho. São culturais.

No capítulo 1, tratando primeiramente dos Arapesh da montanha, cujo título é “A vida na montanha”, a autora localiza este povo pertencente à Bacia Sepik, na Papua Nova Guiné. Inicialmente há um mapa, após a introdução.

Existem dois tipos: praia e montanha. Nas praias havia fartura, porcos gordos, casas espaçosas, grupos de 10 (dez) a 20 (vinte) casas. Não habituados a ataques de caçadores de cabeça. Mulheres desacompanhadas e crianças andam livres. A Praia simboliza a moda e a despreocupação.

Os arapesh das montanhas importam coisas do litoral, como a moda, o corte de cabelo. Existe ainda a crença de que tudo que vem do litoral é superior e fonte de felicidade. Existe a dádiva voluntária, como o Kula, estudado por Malinowski. Já os arapesh das montanhas são franzinos, de cabeça pequena e pelos esparsos. Os das planícies, robustos. isolados do mar, cercado de inimigos. As mulheres arapesh ficam com o serviço pesado pois as cabeças femininas são mais duras e fortes.

Os arapesh entendem a vida como uma aventura de coisas em crescimento. Aposentam-se na meia idade. São bens incompatíveis no mundo dos arapesh: os associados ao sexo e às funções reprodutivas das mulheres e os dos alimentos pelos homens, como a caça, plantio. Mas ambos, homem e mulher estão empenhados em crescer a criança, em função tipicamente maternal.No capítulo 2, "Uma sociedade cooperativa", a vida arapesh está centrada na geração seguinte; homens e mulheres fazem coisas diferentes pelas mesmas razões, não se espera que os homens respondam a uma série de motivações. O homem concebe a chefia, a responsabilidade como uma tarefa árdua, que se sente livre quando o seu filho chega à puberdade. Há atenção às necessidades do outro.

Cada povoado pertence teoricamente a uma família patrilinear, que tem um nome. Marsalai é o ente sobrenatural na forma de cobra ou lagarto colorido, dono das terras ancestrais e de tudo que existe. Ele pune aqueles que não usam bem a terra. Não existem unidades políticas.

Cada homem planta várias hortas (cooperação). Na caça também não vai sozinho. Na construção das casas, também acontece cooperação, mas o homem dá uma festa primeiro. Nenhum homem é dono de suas horas. Para aquele que não ajuda, sofre um brando ostracismo. Não há guerras entre os Arapesh pois “não há honra em matar.” Os que já mataram são postos de lado, de certa forma. São vistos com estranhamento.

Contudo, há conflitos geralmente por causa de mulheres. A política geral dos arapesh é punir quem é contumaz em situações estúpidas (ferir-se na caça, por exemplo). A liderança é utilizada apenas para extensas cerimônias. A liderança é de certa forma imposta, mas em verdade eles não o desejam. Implica em responsabilidades.

É uma sociedade de homens gentis, não-gananciosos e cooperativos. Os jovens são investidos em assumirem as responsabilidades como festas e cerimoniais. Os arapesh por serem sempre cooperativos, não são donos do seu tempo, mas gastam nove décimos do seu tempo fazendo pelos outros. Toda a ênfase de sua vida econômica é posta na participação em atividades que os outros iniciaram. É nesta ênfase que está toda a organização política.

No Capítulo 3, “O nascimento de uma criança Arapesh”, a ideia central é de que a criança é moldada pelo pai e pela mãe durante toda a vida da criança. A tarefa de procriação do pai não termina na fecundação. Assim como na nossa cultura em que um pai pode engravidar uma mulher e voltar quando o filho nasce, para os Arapesh isto seria impossível pois a criação da criação é moldada desde seu nascimento.


Dois tipos de atividade sexual existem quando a mãe arapesh está grávida: o folguedo e o trabalho. Este destinado à criação da criança no ventre e aquele, uma espécie de sexo recreativo. Quanto ao folguedo, entendem que o sêmen em contato com o sangue da mãe alimenta a criança. Quando os seios da mãe incham e apresentam descoloramento, é hora de sossego e repouso pois “a criança está terminada.” Não conhecem enjoos de gravidez. A criança é como um pintinho no ovo.

O pai não fica presente no parto, e não tem contato com a criança e a mãe. A parteira grita (lavem-no) e ele entenderá que a criança deve ser criada. Têm preferência por menino. As meninas são deixadas se já houver filhas na família, assim como se houver condições que tornarão difíceis a vida da criança (pai já morreu, alimento escasso ou se já existem muitas crianças).

O pai de primeiro filho fica numa situação delicada que precisa ser purificado por aquele que já tem filhos. Ele fica segregado com a esposa e fazem cerimônias para se libertarem de todos os tabus, exceto o de comer carne. As esposas do irmão do pai são as enfermeiras oficiais. Fazem encantamentos para a criança ser amável e hospitaleira para com as outras pessoas.


A vida da criança depende do pai e da mãe. O pai dorme com a mãe e o bebê todas as noites. O pai não pode ter relações sexuais com a mãe do bebê ou com as outras esposas, se tiver. Até um ano de idade da criança o sexo é de certa forma, prejudicial. Os tabus podem interferir no crescimento da criança, pois são os tabus que regulam a gravidez. O desmame é feito com lama no bico dos seios, dizendo às crianças que são fezes, cujo desmame pode ser cruel e abrupto para o desenvolvimento da criança. Os arapesh o sabem. O desmame gradativo e tendo o filho bem nutrido é sinal de satisfação entre os arapesh. O trabalho de cuidar dos filhos é do pai e da mãe e nunca é uma tarefa árdua.

No capítulo 4, intitulado, “Primeiras influências que moldam a personalidade Arapesh”, trata a autora de que modo a criança Arapesh é criada para ser gentil, não agressiva e confiante. Não se trata de mera imitação, mas de descobrir como homens e mulheres tratam seus filhos e de como sua experiência na infância afeta os seus filhos. 

As crianças nos primeiros meses de vida nunca estão sozinhas. O choro é algo a ser sempre evitado. São submetidas a dois choques que interferem em seu desenvolvimento futuro. Um banho de água fria e uma interrupção abrupta de suas necessidades fisiológicas naturais. Fora isso, a vida das crianças é quase sempre cálida e feliz, diz a autora. As crianças da aldeia gostam de crianças e se tornam pajens. O aleitamento é cheio de afetividade. Não são impostas às crianças gradações de comportamentos, embora a distinção seja de difícil verificação na prática. Os Arapeh não conhecem restrições de ordem moral, e as crianças não usam roupas até os quatro ou cinco anos. As mulheres dormem nuas e as crianças aprendem regras de limpeza pelo nojo que revelam. Não há pudor no contato entre meninos e meninas.

O contato das crianças com tios e parentes estreitam os laços afetivos. Não há pressa em crescer e cada criança pode tentar empreender atividades para além de suas forças, a qual será acariciada e terá a segurança emocional para os fracassos. As meninas controlam melhor os acessos de raiva que os meninos. Na educação das crianças nenhuma brincadeira é feita se pode encorajar a agressividade e a disputa. Referente à propriedade, são encorajados a respeitar o alheio. Não tanto pelo ter, mas de cuidar do que é dos outros. Se há coisas de valor pela casa, são escondidas das crianças para que não o quebrem. Assim, os pertences da casa são tratados de maneira diversa, pois as crianças em geral brincam e usam e não há grandes proibições.

No capítulo 5, “Crescimento e iniciação do jovem Arapesh”, a criança aos 07 ou 08 anos, a criança tem formada a sua personalidade. Em principal, tem-se o desencorajamento da agressividade, e a busca pela cordialidade no trato com os demais. Na puberdade os tabus se apresentam como punição dele para consigo mesmo, se transgredir as regras desse período. A tarefa dos alimentos é dos homens e da reprodução para as mulheres. As crianças são culturalmente conscientes da fisiologia do sexo. Nesse ponto do texto, o culto ao tamberan é o elemento principal tratado, e significa a proteção sobrenatural dos homens adultos. Quanto ao pai, ele tem o direito de ser rígido porque deu o alimento dado, e não porque simplesmente gerou. À medida que os jovens se tornam adultos, os velhos se retiram. As escolhas das esposas para os filhos são feitas entre cinco e dez anos. A briga por mulheres é ainda uma querela presente na sociedade polígama Arapesh.

No capítulo 6, “O crescimento e o noivado de uma menina Arapesh” o homem é quem cria a esposa, a alimenta e por isso esta lhe deve devoção e apreço. O jovem que é seis anos mais velho, tem na prometida a responsabilidade de plantar inhames, cuidar do sagu e caçar.  A tenra menina é uma futura esposa para o pai, tio e demais do outro clã que a guarda como prometida. Depois de nove ou dez anos, não mais podem ser prometidas como futuras esposas. Os casamentos são feitos para durar e não há regras fixas embora se prefira casamentos de lugares próximos.

Nessa parte do texto, informa a autora que elaborou perguntas sobre o incesto na cultura Arapesh, no entanto, não obtendo respostas a favor ou contra. Em geral, é visto como algo que limita o círculo de cunhados e de pessoas com as quais terão relação de companheirismo e confiança. Por isso ao escolher a esposa de seu filho, o pai leva em conta os irmãos e parentes que irão vir a somar na vida do filho, ajudando-lhe.

No capitulo 7, “O casamento Arapesh” o sexo não é visto fora do casamento pois para eles sexo é um assunto sério. Fora disso, é tomado por feitiçaria. O sexo se liga ao amor, ao alimento dado, à segurança. Entre os Arapesh propõe a monogamia embora permita a poliginia. Para um homem Arapesh é conveniente ter duas esposas. Em suas vidas de casado não são treinados a lidar com as diferenças de criação.No capítulo 8, “o ideal Arapesh e os que dele se desviam”, tem-se também como relevantes as informações de que o mundo é feito para que tudo possa crescer. A ausência de conflito, a gentileza, a cooperação num projeto comum é a tônica da sociedade Arapesh. Sobre os que não compartilham esses adjetivos, os Arapesh da Planície são os responsáveis por todos os infortúnios. Como nos capítulos seguintes, a autora coloca quem são os desviados, os transgressores das regras de cada povo. Os Arapesh das Planícies matam por lucro e ódio. Na sequência, a autora trata das brigas no rapto de uma mulher. A descrição traz relatos específicos que demonstram um ponto interessante é onde a autora tratará dos homens e mulheres violentos, bem como os maliciosos e que praticam pequenas doses de magia negra e personalidades aberrantes e violentas. 

Assim, por concluir e tendo apresentando os pontos essenciais da sociedade Arapesh, a presente resenha conclui que o capítulo traz interessante apreciação, bastante consistente e bem descrita sobre elementos importantes do temperamento Arapesh, cujo povo é essencialmente gentil e cooperativo, bastante ao contrário do grupo tratado no capítulo seguinte, os Mundugumor. 

Sem discutir o entendimento sobre o termo temperamento, MEAD que vem da área de psicologia, designa a cultura como fator preponderante na formação da personalidade e demonstra que o desenvolvimento do homem enquanto ser da civilização constrói, essa tessitura diferente. Cada geração é moldada às tendências dominantes onde cada indivíduo inclina-se a um tipo de comportamento que não reconhece sexo, idade, força, beleza. Institucionaliza-se um temperamento.

Comentários

  1. Sabe se o livro está disponível na internet?

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    1. Está sim! colocaremos aqui, no blog, posteriormente.

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